Por: Lucas Esteves (Twitter: @lucasesteves)
Semanas de convocação não adiantaram – em certo sentido. A manifestação das centrais sindicais e representações de trabalhadores de diversas outras categorias profissionais não contagiou a população em Salvador e revelou o “divórcio” que as entidades vivem em relação ao povo brasileiro. Na manhã desta quinta-feira (11), milhares de pessoas foram às ruas do Centro da capital para protestar, mas um olhar cuidadoso nos presentes revela: o povo não compareceu ao evento. Viu, encostado na parede, os típicos discursos que estereotipam os sindicatos há décadas.
Para os líderes das centrais sindicais, porém, não há divórcio nem crise, ao contrário. Para os sindicalistas, historicamente os grupos levam adiante o grito popular e as reivindicações de melhoras e todos os momentos de revoltas sociais terão sempre a participação fundamental das representações dos trabalhadores. A falta de adesão popular não lhes pareceu, portanto, incomodar.
Mais cedo, no momento da concentração, o Comércio estava totalmente fechado e quem passava pelas ruas estava em trânsito para outras áreas ou acessando os locais de sua residência. Enquanto a manifestação rumava do Campo Grande em direção à Praça Municipal, curiosos se reuniam em pequenos grupos para ver à distância o que ocorria. Alguns souberam do movimento na hora. Outros, pela TV ou jornais. Mas não havia em geral intenção de se juntar ao grupo.
A falta de adesão poderia ser explicada, talvez, pelo imaginário recente de que as manifestações são ocasiões perigosas, nas quais é possível e até provável se ferir por conta de confronto entre protestantes e a polícia. Entretanto, o clima foi de paz e a PM não interviu em nenhum momento, acompanhando de perto, mas passivamente o protesto. Mesmo assim, quem não fazia parte do grupo não demonstrou nenhuma animação para se juntar e tentar mudar a realidade, para se usar os discursos das centrais.
Cidadãos como o serralheiro Januário dos Santos, que tomava sua cerveja em uma esquina com um amigo, diziam que os sindicatos ainda eram importantes na realidade brasileira, mas avaliavam ao mesmo tempo que “não é fácil” se engajar na luta política de categorias. “Nunca tive chance de participar muito de sindicatos”, lamentou. Perguntado se a hora era aquela, avaliou que era “melhor não”.
Já a professora estadual Iara Nascimento disse que soube do protesto pelos jornais e veio ao local unicamente para acompanhar a movimentação, mas à distância. Ela disse que, apesar de saber que a representação sindical de sua categoria é a APLB, não crava que a entidade a representa e que, no fim das contas, prefere ter sua voz levantada pela do povo nas ruas. “A APLB me representa mais ou menos, né? Partido eu acho que não representa. Não representa ninguém. Não acredito neles e quem me representa é o povo”.
O comerciário Marcos Silva, filiado ao seu sindicato, disse que apesar de participar de lutas de categoria, não fazia ideia de quem são os responsáveis pelas grandes centrais, a exemplo da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Força Sindical e União Geral dos trabalhadores (UGT). Ele disse que estava no local para reivindicar bandeiras tão díspares quanto acarajé e sushi: “acabar com o voto obrigatório e deixar o povo votar pela internet para acabar com todos os problemas do Brasil”.
A luta continua – Os sindicalistas, porém, recusam esta visão e dizem que não existe como dissociar a luta popular dos sindicatos e que, por mais que haja um atual movimento de apartidarismo entre os jovens, a luta pelo trabalho é histórica e central na vida de todas as sociedades, das mais primitivas às mais desenvolvidas. De acordo com o presidente do Sindicato da Indústria e Construção Civil da Bahia (Sintepav), Adalberto Galvão, houve uma tentativa frustrada no passado de divorciar as lutas das reivindicações trabalhistas que a força do lavoro ajudou a combater.
“As manifestações ocorridas na Europa e Estados Unidos, mesmo no centro do capitalismo, não estão divorciadas do trabalho. Portanto, nós não podemos aceitar essa ideia como (Francis) Fukuyama no passado preconizou como sendo o fim do trabalho. Fukuyama errou. Quando os capitalistas apoiaram a ideia dele de que o trabalho não teria mais vez, ao invés disso o trabalho se afirmou e mesmo os países mais ricos entendem que a saída é pelo trabalho enquanto valorização social de homens e mulheres”, defende.
O afastamento de partidos das manifestações em oposição ao caráter profundamente político-partidário dos sindicatos também não faz os representantes considerarem que haja rejeição aos grupos nos setores sociais hoje. Para a presidente da Força Sindical, Nair Goulart, os sindicatos têm pluripartidarismos e que lideranças têm cada um a sua legenda, mas que nenhum trabalhador em nenhum momento é obrigado a professar as ideias destes grupos. O convite do sindicato é pela união coletiva em busca de bandeiras que, no final, são as mesmas dos manifestantes jovens que ocuparam as ruas.
“O partido é uma questão individual. No sindicato, entra no partido quem quer. Tanto que a participação nos partidos, a filiação é muito pequena. É preciso toda uma conscientização da sociedade brasileira, porque o partido é uma escolha sua. Não é o sindicato que escolhe se devemos seguir o partido”, argumenta. Ela, porém, defende que apesar de haver reivindicações nas ruas, o sindicato é e sempre será o grupo que reunirá as demandas dos trabalhadores e lutará por elas contra os opressores.
A visão do presidente da UGT, Magno Lavigne, é mais “estatística”. Ele acreditar meio de avaliações exaustivas em sua central que quem rejeita os sindicatos hoje é quem sempre os rejeitou historicamente. Mesmo assim, quem foi para a rua com este discurso levou as bandeiras sindicais consigo da mesma maneira e, por isto, não há como separar a importância dos sindicatos das lutas sociais, seja de ontem ou de hoje. O problema, segundo ele, é o potencial de mudança imanente que o sindicato possui.
“Alguns setores aí mais radicalizados, mais à direita, não querem contato com o movimento sindical exatamente porque sabem que as reivindicações do sindicato têm consequências. Quando o sindicato quer aumento de salário, ele quer para aquele mês. Quando ele quer o fim do fator previdenciário, ele quer para aquele mês. A batalha política está apenas começando. O movimento sindical não está dizendo nem ‘viva Dilma’ nem ‘fora Dilma’. Está dizendo ‘se liga, Dilma’”.
Os sindicalistas, porém, reconhecem que que é preciso haver uma atualização das entidades para que haja mais empatia entre as ruas e as assembleias. Para o presidente da CTB, Aurino Pedreira, é preciso haver um pensamento mais orientado para que as centrais entendam melhor o que se pede nas ruas e que isto seja espelhado nas reuniões internas e convocações. Por outro lado, lembra que é normal haver o acompanhamento – por parte dos sindicatos – dos clamores populares uma vez que o povo começa revoltas espontaneamente. “Uma entidade nunca poderia não ouvir o clamor do povo. E nós, por sabermos que o povo está certo, nós estamos lutando.”
FONTE : BOCÃO NEWS
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